Darcy Ribeiro e a Biblioteca Básica Brasileira
Pode ser que para muitos a incógnita Brasil seja relativamente recente. Como explicar o país; quem são os brasileiros; o que pensam; do que vivem? A busca pela elusiva identidade nacional, no entanto, foi, e continua sendo, um dos grandes alicerces das nossas ciências sociais. Marco desta busca foram as imponentes coleções editadas a partir de 1931, tal qual a Coleção Brasiliana publicada pela Companhia Editora Nacional (e digitalizada pelo Projeto Brasiliana Eletrônica), e a Coleção Documentos Brasileiros editada pela Livraria José Olympio Editora.
Os quase cem anos de investigação produziram grandes intérpretes, perpetuaram mitos e introduziram ainda mais dúvidas. Parte do problema, eu diria, provém da dificuldade de impor uma interpretação a um objeto que se desconhece. Como se teoriza uma identidade nacional, sem uma nação que se entende como tal?
No início da década de 1960, provavelmente movido por ideias similares, Darcy Ribeiro, então reitor da UNB, idealizou o projeto Biblioteca Básica Brasileira (BBB). A intenção do antropólogo era publicar e distribuir gratuitamente para escolas e bibliotecas públicas obras clássicas que pensam e problematizam aspectos da história e da identidade brasileira. O intuito não era apresentar uma resposta monolítica sobre o ‘ser Brasil’, mas oferecer uma gama de interpretações e possibilidades. A identidade, tanto individual quanto coletiva, não seria imposta, mas construída.
O golpe de 64, para infortúnio dos que acreditam em educação transformadora, pôs fim à Biblioteca cívica de Darcy Ribeiro. Felizmente, após um hiato de 50 anos, o projeto foi retomado e reformulado pela Fundação Darcy Ribeiro. Em 2014, com apoio da Lei de Inventivo à Cultura/Lei Rouanet, os primeiros 50 títulos da coleção BBB foram publicados. De “Viagem ao Brasil” de Hans Staden –relato de um viajante alemão nos idos 1500s— ao clássico “Os sertões” de Euclides da Cunha, todos os volumes podem ser acessados gratuitamente no site da Fundação.
A seleção não é perfeita. Faltam nomes clássicos da historiografia como Raymundo Faoro e Sérgio Buarque de Holanda. Faltam também nomes que deveriam ser clássicos, mas ainda não são, como Carolina Maria de Jesus. Ainda assim, para aqueles que se pegam tentando entender o que parece ser inteligível, é um ótimo começo.